Cartas prontas, roupa escolhida, ligações feitas.
Luz acesa, quarto organizado, pensamentos bagunçados, talhos iniciados.
Os olhos refletiam o vazio da alma. Sempre pensou
que estava fadada a um destino podre, à inutilidade de uma vida marcada pela
sensualidade e pela malícia. Não se sentia assim na infância, mas viu-se como
um corpo vazio entre corpos de mulheres e homens durante o pouco tempo de adulta.
Lágrimas escorrendo, sangue maculando o vestido,
memória rasgando-se em clarões e raios. Um grito, a dor, um arrependimento, o
vazio da morte solitária.
As mãos tremiam a frieza do coração aflito.
Lembrou-se da tia que ousou ter o mesmo fim que ela. Pensou nas frases que sempre
ouviu das amantes. Chorou.
Pulsos abertos, lençol manchado, silêncio. A
partida trazia a certeza de que ela sempre esteve
fadada ao luxo e ao lixo alheios, como uma boneca de louça em mãos impuras.
Lembrou-se da mãe, pediu perdão a sua amada, que ligou no último instante , fechou os olhos, bebeu as lágrimas da morte.
Leila Andrade